terça-feira, 5 de abril de 2011

A fórmula de um livro

“Juntamos algo da nossa experiência vivida a algo que não conhecemos”, assim fala Rui Zink a propósito do seu livro Hotel Lusitano, numa breve entrevista à RTP2. Esta pode ser entendida como uma fórmula, a meu ver, que permite ao autor ir além de si sem sair de si, no acto da escrita; uma permanência do Eu que se combina com a sua própria imaginação, um “vá para fora cá dentro”, como já dizia o slogan publicitário...
A grande dificuldade daqueles que procuram escrever para um público numericamente maior que as três pessoas que têm sentadas no sofá da sala de estar, decerto terá a ver com questões de inibição relativamente a uma escrita que parece não ser capaz de ultrapassar o nível da telenovela que se confina às quatro paredes. No entanto, sugere-se-me que possa também estar relacionada com essa (in) capacidade de misturar, com esse receio de não se atingir o “ponto caramelo” da literatura invejável.
Alguns, e inumeráveis, serão os autores que pecaram pela separação do vivido e do imaginado, explorando separadamente cada um deles, não permitindo que um tempere o outro, e, desse modo, somos levados numa escrita que, ou é demasiado pessoal e apaixonada (que nos toca na pele até fazer ferida), ou demasiado ilusória e pouco tangível. Há uma relação proximidade/afastamento com o livro que precisa ser criada, e esta terá certamente a ver com o equilíbrio perfeito entre a verdade e a fantasia, entre aquilo que o autor sentiu e aquilo que a imaginação lhe ditou. É desta contaminação que parece viver a boa literatura, aquela que não nos arrancando impiamente à realidade, nos deleita nas suas possibilidades ínfimas e desconhecidas.
Inês Lourenço

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